CAIM - Que lição?

segunda-feira, 26 de outubro de 2009



“Depois o criador virou-se para a mulher: Como te chamas tu?
Sou a Eva, Senhor, a primeira-dama, respondeu ela desnecessariamente, visto que não havia outra.
Deu-se o Senhor por satisfeito, despediu-se com um paternal “até logo” e foi à sua vida. Então pela primeira vez, Adão disse para Eva: Vamos para a cama.”

Eis um trecho do novo e, já, polémico livro de José Saramago: Caim.
O Nobel da literatura portuguesa, ao longo da sua vida, tem denunciado o “manual de maus costumes”, por este conter situações de ódio, guerra, vingança e, sobretudo, por o seu Deus ser rancoroso.
O comunista, como lhe chamam, é acusado de realizar interpretações abusivas da Bíblia e, para alguns, de proferir banalidades “republicadas” semelhantes as que se proferiam nas tascas no século XIX. Quanto às banalidades, não me pronuncio, mas acho estranho tanto incómodo por “banalidades”; contudo, aquilo a que alguns denominaram “interpretações abusivas”, não faz sentido.
Se é um facto que alguns elementos/passagens bíblicas constituem uma verdade factual, comprovada arqueologicamente, outras passagens não o são. Alias, julgo que Saramago se refere às passagens comprovadas historicamente, como aquelas que representam o “Manual de maus costumes”. Esse “Manual de maus costumes” refere-se, por exemplo, às sangrentas guerras bíblias levadas a cabo pelo “povo de Deus” ora para conquistar, ora para defender a “Terra prometida”; refere-se aos casos de incesto; refere-se aos casos de vingança entre homens e entre Deus e os homens.
Sobre isto, não percebo como se pode criticar Saramago!
Poderei entender as críticas referentes à outra parte, isto é, elucidativas das passagens não comprovadas ou comprováveis cientificamente. Estas entram no domínio da fé e, assim sendo, entendo que as pessoas se sintam infligidas nos seus valores. Porventura, a fé é um campo subjectivo e repleto de areias movediças, pelo que, colocando um ateu e um verdadeiro católico, frente a frente, eles discutiriam eternamente sem chegar a nenhuma conclusão.
Por este motivo, neste campo limito-me a dar a minha opinião e a não dizer que este ou aquele está errado, pura e simplesmente, trata-se de convicções e cada um defende as suas.
Eu sou da opinião de Saramago. A parte comprovada da Bíblia é um manual de maus costumes e não dá boas lições a ninguém; a parte ficcional ou de fé, apresenta-se muitas vezes com um Deus invejoso e insuportável.
Alias o livro “Caim” é um pequeno exemplo disso mesmo. Caim terá sido um (senão o) dos primeiros homens a nascer de relações sexuais entre Adão e Eva. Um certo dia, Caim e Abel (seu irmão mais novo) apresentaram oferendas a Deus. Caim teria oferecida frutas e Abel ovelhas do seu rebanho. Deus terá gostado mais das oferendas de Abel do que Caim, visto que tinham sido dadas com mais sacrifício; Caim possuído por ciúmes terá orquestrado o assassinato do seu irmão. Deus castigou-o condenando-o à condição de errante do mundo.

Ora é contra isto que eu me insurjo e que Saramago critica. Deus, o Todo-Poderoso, faz algo que um simples pai não deve fazer. Não exige ser adorado, não prefere as oferendas de um a outro e, após se ter cometido um erro, não age com vingança.
Eu pergunto: Onde está o amor de Deus nestes actos?

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