Instrumentalizações

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010


O país, nos últimos dois meses, tem assistido a uma corrente incessante de notícias sobre escutas e mexericos. O termo inqualificável, talvez seja o mais apropriado para o que temos assistido. Não se trata de efectuar juízos de valor aos escutados, sejam eles Pinto da Costa, José Sócrates, António Preto ou Armando Vara, mas sim de julgar o acto de divulgar e espalhar escutas que legalmente deveriam estar em segredo de justiça.
Os nomes referidos devem e podem ser julgados em tribunal e nunca na praça pública, sob pena de criarmos um país onde a lei do mais forte, do mais populista e do mais corporativista se sobrepõe a todas as outras. Ora, os exemplos do passado estão na memória de muitos e, a bem de todos, deveriam manter-se apenas como meros exemplos.
A instrumentalização de escutas e/ou imagens não podem ser usadas para manipular a opinião pública porque, quer queiramos quer não, somos manipuláveis e percepcionamos a realidade circundante “à nossa maneira”. Olhem para os vários exemplos: Alberto João Jardim na Madeira para uns é um reles oportunista e demagogo, para outros é o melhor estadista do país; Salazar para uns foi um infame ditador, para outros foi um esplêndido governante; para uns o aborto é uma violação grave do direito à vida, para outros é um direito que assiste à mãe.
Os exemplos continuariam “ad aeternum”, assim o quiséssemos. Dir-me-ão que se trata, pura e simplesmente, da liberdade de expressão. Certamente que sim, mas demonstra-nos que apesar de não estarmos de acordo com a visão do outro, devemos respeitar a sua opinião. A nossa opinião não tem de ser melhor do que a do outro, nem pior; muito provavelmente será diferente.
Usar toda a espécie de artifícios e práticas ilegais, só para demonstrar que nós é que estamos certos e nós é que somos os detentores da razão, acabará por gerar mais injustiças, mais ilegalidades, mais violência, enfim, um país pior.
As recentes publicações das escutas de Pinto da Costa no Youtube e as ameaçadoras transcrições do Correio da Manhã sobre José Sócrates revelam que estamos num país, em que não se pode falar ao telefone, não se pode estar a mesa e conversar descansadamente e, dentro de pouco tempo, não se pode fazer aquilo que aqui estou a fazer. Quando visualizo escutas no Youtube ou leio as transcrições de escutas num jornal estou, involuntariamente, a estimular a prática de um acto que é ilegal e muitíssimo perigoso. Por isso, deixo-vos com um conselho: viver em democracia implica responsabilidade, cidadania, crença nos órgãos de soberania, nomeadamente nos tribunais, e respeito pela liberdade e privacidade do outro.
Quero estar à mesa de um restaurante, ao telefone ou a escrever num blog e não me sentir constrangido em afirmar que “aquele fulano não presta, não sabe o que está a fazer e devia ser arrumado dali para fora”. Se não o poder fazer, o que é isto senão uma ditadura?

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  © Feira das Conspirações! - Santa Maria da Feira - Portugal - Maio/2008

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